Futebol romeno renasce à sombra de dinheiros suspeitos

Em Janeiro deste ano surgiu a notícia da investigação de pelo menos 12 transferências do futebol romeno entre 1999 e 2005. Estão em causa eventuais situações de fraude fiscal e de lavagem de dinheiro com vários dirigentes dos principais clubes do país suspeitos, designadamente George Copos, proprietário e presidente do Rapid de Bucareste, Jean Padureanu, presidente do Glória Bistrita, além dos empresários Gheorghe Popescu (ex-internacional romeno) e Victor e Ioan Becali, estes dois últimos primos de George Becali, proprietário do Steaua de Bucareste. Sob suspeita estão ainda Cristian Borcea, Mircea Stoenescu e Gheorghe Netoiu, ex-administrador, ex-presidente e o actual proprietário do Dínamo de Bucareste.Gigi Becali
O caso nem sequer surpreende à luz de uma sociedade romena corruída pela corrupção. Num país onde política e futebol se confundem muitas vezes, alguns milionários têm feito vida nos dois hemisférios, sendo George Becali uma espécie de Sílvio Berlusconi à romena. O dono do Steaua fez fortuna investindo no mercado fundiário e comprou o clube em 2003, criando no ano seguinte um partido de extrema-direita. Não será alheio a esse facto a circunstância de as claques do Steaua serem vistas no Estádio com cartazes de teor racista, sobretudo contra a comunidade cigana que é conotada com o rival Rapid.Gigi, como é mais conhecido, está a ser investigado no âmbito de uma troca de terrenos com o exército romeno, mas foi à custa desta figura controversa - diz-se que terá encomendado uma cópia do quadro de Leonardo da Vinci "A Última Ceia" com ele personificado em Jesus Cristo e os jogadores do Steaua pintados como discípulos - que o actual quarto classificado da Liga romena voltou aos bons resultados europeus na época 2005/2006, onde chegou às meias-finais da Taça UEFA.Outro caso emblemático da promiscuidade entre futebol e política é o do Rapid, segundo classificado da Liga que contratou há dias Vasco Matos ao Beira-Mar e que acordou nesta quarta-feira com a União de Leiria a aquisição de João Paulo. O dono do clube, George Copos, foi membro do governo, demitindo-se após um escândalo de corrupção que o implicava em situações de abuso de poder. Este proprietário de uma cadeia de lojas de electrodomésticos e de hotéis e membro do Partido Conservador, foi entretanto acusado de evasão fiscal.O campeonato romeno tem sido marcado ao longo dos anos por várias suspeitas de corrupção, especulando-se desde sempre sobre um alegado favorecimento estatal a Dínamo e Steaua que ganharam 16 campeonatos entre si durante os 24 anos de governo de Nicolae Ceausescu (de 1965 a 1989). Na actualidade as suspeitas continuam e o actual líder do principal escalão do país, o CFR Cluj, não se livra das acusações de compra de árbitros.Arpad
A ascensão do emblema que tem dez portugueses no plantel - guarda-redes Nuno Claro (ex-Paços de Ferreira), defesas Tony (ex-Est.Amadora), Cadu (ex-Boavista), Fredy (ex-Paços Ferreira) e Amoreirinha (ex-Est.Amadora), médios Manuel José (ex-Boavista), Pedro Oliveira (ex-V.Setúbal), André Leão (ex-Beira-Mar) e Dani (ex-Paços Ferreira), e o avançado Semedo (ex-Est.Amadora) - surpreende no panorama europeu. Em 2001 o CFR Cluj estava com um pé na 4ª divisão e à beira da falência, até que Arpad Paszkanyi, empresário da área do imobiliário e do ramo automóvel, assumiu o controlo do emblema. A recuperação foi evidente e na época 2006/2007 foi terceiro classificado do principal escalão, garantindo a qualificação para a Taça UEFA.Também interessante é o caso do FC Unirea que subiu ao principal escalão romeno em 2006 e que é o actual terceiro classificado da tabela. Este clube é propriedade de Dumitru Bucsaru, empresário com ligações próximas ao presidente romeno, Traian Basescu, e que tem sido implicado em vários negócios dúbios com políticos e com o próprio Estado. Bucsaru começou a patrocinar o Unirea em 2002 quando este estava na terceira divisão e pagou a construção de um Centro de Treinos, melhorou e aumentou o Estádio e guindou a equipa até ao primeiro escalão em apenas 4 anos. Com um plantel maioritariamente composto por romenos, a meta é agora chegar à Europa, algo muito provável à luz da classificação actual.Há ainda o Politehnica Timisoara, emblema onde joga Milhazes, ex-Rio Ave. O clube esteve em maus lençóis financeiramente, mas contou com os investimentos de Marian Iancu, empresário do sector petrolífero que é investigado por irregularidades fiscais no negócio de venda de uma refinaria de petróleo, e é quinto no campeonato romeno. Mais atrás está o FC Vaslui que foi fundado em 2002 e que subiu ao primeiro escalão em apenas 3 anos sob a batuta financeira de Adrian Porumboiu, presidente de um grupo económico que actua nas áres do turismo e agricultura e que foi árbitro FIFA entre 1986 e 1995. É sétimo da Liga e contratou recentemente Hugo Luz à Olhanense.UEFA
E se é certo que na presente época, os clubes romenos não tiveram grande desempenho a nível europeu - o Steaua foi último da sua série na Fase de Grupos da Liga dos Campeões; o Rapid foi afastado pelos alemães do Nuremberga na primeira eliminatória da Taça UEFA, enquanto o Dínamo pereceu na mesma fase aos pés do Elfsborg da Suécia e o Cluj foi eliminado na segunda pré-eliminatória diante do Anorthosis do Chipre -, o futebol do país aparece no sexto lugar do ranking da UEFA, à frente de Rússia e Portugal. Uma posição para a qual os 2600 pontos averbados nesta época não contribuíram grande coisa, mas que beneficia dos resultados das duas temporadas anteriores, onde somaram 28.666 pontos, enquanto Portugal fez apenas 13.583.Federação Romena
Mas o melhor resultado do futebol romeno dos últimos tempos é o apuramento da Selecção para o Euro 2008 com o primeiro lugar do Grupo G, onde somou mais 3 pontos do que a Holanda. No torneio a disputar na Áustria e na Suíça, a Roménia terá de novo pela frente a Holanda, além da Itália e da França no Grupo C. Não se adivinha tarefa fácil, mas a qualificação é já um grande prémio para um país que há quase oito anos não disputava uma fase final de uma grande competição internacional.Susana Valente