Pornografia e Apostas, os novos vícios dos futebolistas

Solidão dos estágios propicia vícios na InternetDe Maradona, que se sujeitou a uma desintoxicação de cocaína já depois do adeus aos relvados e que foi por duas vezes banido enquanto jogava no Nápoles por ter acusado a presença daquela substância em controles anti-doping, a Garrincha e George Best que cedo morreram por se terem deixado tentar pelo álcool em excesso, o mediatismo que o futebol concede parece trazer no reverso da moeda uma vulnerabilidade a certos vícios. Nos tempos modernos, e na era das novas tecnologias, a pornografia e as apostas facilmente acessíveis via Internet estão a tomar lugar entre as dependências que afligem os homens do futebol. Isolados nas concentrações dos clubes, muitos dos jovens atletas passam o tempo debruçados sobre os seus computadores portáteis e com os milhares que vão amealhando o jogo assume-se como um divertimento inocente. Aposta puxa aposta, o dinheiro vai-se perdendo no vácuo virtual e o vício cresce na mesma medida, enquanto a fuga em sítios pornográficos surge como bálsamo para o prejuízo numa bola de neve que se arrasta até altas horas da madrugada, independentemente dos treinos do dia seguinte ou dos jogos. Este cenário é traçado pelos responsáveis da Sporting Chance Clinic (SCC), uma estrutura direccionada para o tratamento das dependências de desportistas e que foi criada em Setembro de 2000 por Tony Adams, ex-jogador do Arsenal e ex-capitão de Inglaterra e um alcoólico recuperado. Se o álcool tem sido o vício que ao longo do tempo tem levado maior número de futebolistas à Clínica, actualmente 70 por cento dos jogadores que a ela recorrem fazem-no devido a problemas de jogo, de acordo com os responsáveis da SCC. Clarke Carlisle, defesa inglês de 27 anos que joga no Watford, foi um dos casos recentes tratado por esta Clínica e na imprensa inglesa o atleta fala de um «ciclo terrível» entre perder milhares em apostas e beber para amenizar a perda. Carlisle destaca o facto de os jogadores serem «retirados de casa muito cedo e subitamente tornam-se exemplos para os jovens da nação e como podem desempenhar esse papel quando eles próprios também são jovens», questiona. O director da SCC, Peter Kay, releva que alguns futebolistas levam «vidas muito solitárias, especialmente quando são enviados para os seus quartos de hotel das oito da noite até às oito da manhã do dia seguinte antes de um jogo», realçando as tentações que perpassam pelo mundo virtual e falando numa busca desenfreada que pode arrastar-se até de madrugada e depois «não estão em condições para jogar futebol» no dia seguinte, salienta. O vício e a obsessão que este suscita têm inevitavelmente reflexos no rendimento do jogador e podem mesmo motivar violência e agressividade em campo.Jardel entre boatos e certezas...Em Portugal as adições de jogadores não têm passado de boatos sem confirmações, sendo o caso de Mário Jardel o único que mereceu investigação mais intensa da comunicação social. O actual avançado do Beira-Mar nunca confirmou contudo o seu envolvimento no jogo clandestino ou as especulações de dívidas da ordem dos 400 mil contos, nem as alegações de abuso de consumo de álcool, de drogas e o envolvimento com prostitutas. Certo é que o brasileiro nunca mais foi o mesmo "matador" desde que esses rumores vieram à baila, procurando agora recuperar a imagem de goleador em Aveiro. Já após o regresso do avançado a Portugal, em Setembro passado dava-se conta no Jornal 24 Horas da desintoxicação do atleta numa Clínica de Vila Real.Por Inglaterra surgiram também recentemente murmúrios do envolvimento de Wayne Rooney, avançado do Manchester United, em apostas de corridas de cavalos, cães e jogos de futebol onde não estava implicado, com os tablóides britânicos a anunciarem que o internacional inglês terá contraído dívidas da ordem das 700 mil libras quando tem um ordenado semanal de 60 mil. Público e assumido é o gosto de Michael Owen pelas apostas, com o atleta do Newcastle United a ser inclusivé sócio da empresa de apostas Goldchip, embora não haja dados que apontem no sentido de uma adição. O problema é quando do razoável se passa à compulsão...Numa espiral entre jogo, droga e álcool andou Paul Merson, ex-internacional inglês que passou por Arsenal e Middlesbrough que conta actualmente 38 anos e que foi um "cliente" recente da SCC. Pela Clínica passaram ainda Fernando Ricksen, defesa holandês de 30 anos que está emprestado pelo Rangers, da Escócia, aos russos do Zenit de São Petersburgo, e Paul McGrath, ex-internacional irlandês que jogou no Manchester United e que conta actualmente 47 anos, ambos devido a problemas de alcoolismo. O romeno Adrian Mutu (Juventus) sujeitou-se também a um plano de recuperação de dois meses na SCC depois de suspensão da FIFA por sete meses após ter acusado cocaína num controle anti-doping. Mutu acabou por ser despedido do Chelsea devido a este caso antes de assinar pelo emblema italiano.Na SCC o programa de tratamento baseia-se nos 12 passos dos Alcoólicos Anónimos e pode ser feito em regime semi-aberto ou de internato numa infra-estrutura situada em Hampshire, no sul de Inglaterra, bem longe das luzes da ribalta que o futebol oferece. Além da reabilitação de dependências, a Clínica faz seminários nos clubes sobre os efeitos físicos do uso de drogas e álcool nos atletas, tendo para o efeito uma parceria com a Associação de Futebolistas Profissionais.Susana Valente