A Crónica da Semana

Eusébio, o atirador
por xerxex

Vi um documentário de Eusébio no canal História... Mais um! E revi algumas
jogadas brilhantes, ouvi recordações nostálgicas de grandes jogadores mundiais e
dei comigo a pensar...

Não sou propriamente um paladino do futebol de outrora e, após visionar vários
jogos completos de várias décadas, posso afirmar a minha opinião que é quase uma
certeza: qualquer super-equipa de 50, 60 seria trucidada por uma equipa
razoavelmente boa do futebol moderno.

Se alguém realizasse esse velho sonho humano de viajar no tempo e trouxesse um
Pelé, um Garrincha, um Puskas aos dias de hoje (directamente do auge das suas
carreiras) para um jogo de futebol, não se destacariam do grande pântano de
vulgaridade em que a maioria dos jogadores actuais atolaram.
Trazidos ainda crianças, com as condições de treino modernas, etc, etc,…seriam
evidentemente soberbos talentos, mas nunca tão elevados como outros tempos
permitiram.
É provável que nunca mais haja um futebolista com essa aura de
semi-deus.
Como em todas as áreas, os pioneiros têm sempre o reconhecimento maior (e
justo!). Puskas, Pelé e Eusébio podem não ter sido os primeiros grandes craques,
mas foram os primeiros atingidos pela onda de mediatização que mudou para sempre
o destino do futebol, e assim perdurarão para sempre.

No entanto e felizmente, há excepções que desafiam toda esta lógica. Há sempre
um Maradona, um Schumacher ou quem sabe, um Mourinho, que conseguem superar
tudo, mesmo em circunstâncias muito mais competitivas, e sair da glória do
presente para a lenda futura. Essa é uma das razões que na eterna discussão
Maradona ou Pelé me faz tender para a bolinha argentina...

Para todos os que contrapõem que é mais sublime criar do que aperfeiçoar uma
criação, relembro que quase tudo é um constante plágio aperfeiçoado do qual
por vezes faísca e salta alguma inovação.
Se Pelé inventou um determinado drible ou gesto técnico? É possível que sim, mas
nunca saberemos se tantos como lhe atribuem, porque antes dele não havia
praticamente futebol televisionado (o que por outro lado o valoriza, dado que as
suas fontes de inspiração não tinham um campo tão abrangente). Mas é óbvio que
era um génio.
Um génio suplantado por alguns discípulos... Por vezes acontece. E é aqui que
quero chegar em relação a Eusébio. Comparando características específicas de
lendas do futebol mundial com jogadores actuais é inevitável reparar na
evolução e aperfeiçoamento.

Pelé era brilhante tecnicamente? Sim, mas hoje temos um Ronaldinho Gaúcho que
o supera nesse ponto.
Garrincha e Stanley Matthews eram insuperáveis no drible? Sim, mas hoje temos
dribles ainda mais estonteantes feitos por jogadores como o nosso Cristiano
Ronaldo e novamente o Ronaldinho Gaúcho.
Bobby Charlton tinha um controle de bola fantástico, qualidade de passe e visão
de jogo soberba? Sim, mas o que dizer então de Zidane?
E Yashin, uma aranha voadora? É notório que tinha o instinto e agilidade, mas
perderia em toda a linha com os guarda-redes actuais devido à falta de técnica
específica do posto.

Passe, drible, técnica (questões atléticas, questões tácticas posicionais e
capacidade defensiva individual, cruzamentos, jogo de cabeça nem vale a pena
comparar)...
Falta aqui alguma coisa? Sim!
Faltou a referência ao REMATE! E é isto que me deixa fascinado. Tudo evoluiu,
tudo se aperfeiçoou, mas ainda está para nascer aquele que destronará o nosso
Eusébio como o melhor rematador de todos os tempos! Potência, colocação,
postura de corpo irrepreensível, ambos os pés, delírio de multidões.
No cômputo geral nunca vai ser reconhecido sequer no Top 5 dos melhores de
sempre (a FIFA deu-lhe o 9º lugar, se não me engano), mas provavelmente, daqui a
100 anos (e enquanto outros vão sendo esquecidos), quando o futebol se tornar
uma ciência "criativa", ainda recorrerão a imagens de Eusébio para a
demonstração perfeita de um remate.
Ave Eusébio, o atirador!

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