Duarte Gomes: "Sou um árbitro mediano" (Exclusivo) | Relvado

Duarte Gomes: "Sou um árbitro mediano" (Exclusivo)

Na terceira parte da sua entrevista ao Relvado, confessa que existem outros colegas com mais "capaci
 

Na terceira e última parte da sua entrevista ao Relvado, Duarte Gomes garante que nunca o tentaram subornar, mas conta o episódio em que um dirigente foi particularmente ameaçador. Considera-se apenas um árbitro mediano, confessa que se motiva quando é insultado pelo público e revela-se a favor da introdução de um único meio tecnológico: o chip na bola ou na linha de baliza. 

Relvado - Já recebeu uma "proposta indecente" de algum clube?

Duarte Gomes- Honestamente, não. Tive uma vez a situação de um telefonema pós-jogo, da parte de um presidente de clube, há 8 ou 9 anos. Em tom ameaçador, disse-me que a arbitragem tinha sido uma vergonha. Desliguei o telefone e dei conhecimento imediato do telefonema ao presidente do Conselho de Arbitragem. Mas nunca tive qualquer proposta pré-jogo, nem qualquer tipo de suborno. Acho que isso hoje em dia está fora de questão, pois existe muito receio das escutas, as pessoas têm medo de ser apanhadas. Ao menos o Apito Dourado foi bom nessa questão, porque foi preventivo, mesmo não tendo sido punitivo.

Há uns anos atrás notava-se uma excessiva simpatia quando a equipa de arbitragem chegava ao balneário. Era do género 'se eu for simpático, pode ser que me beneficies'. E depois, muita azia se as coisas não corriam bem... Mas isso acabou quando as pessoas começaram a perceber que se ganha tanto em casa como fora e que os jogadores são expulsos em casa e fora. E esta geração de árbitros tem tido um contributo importante para a mudança de mentalidades.

R - Pode saber-se qual foi esse presidente que o ameaçou?

DG - Honestamente, não me parece necessário. Até porque esse senhor já não está nesse clube, que continua muito bem e a ser bastante respeitável. O senhor saiu pouco tempo depois, de forma um pouco forçada. Era alguém que pensava que as coisas ainda se resolviam à moda antiga...

R - Os clubes portugueses ainda oferecem presentes aos árbitros?

DG - No início da minha carreira na I Liga, ainda havia alguns clubes com algumas ofertas simbólicas. Por exemplo galhardetes, pequenas medalhas ou pratos da Vista Alegre. Mas isso foi-se esbatendo e eu há muitos anos que não tenho qualquer abordagem nesse sentido. Apenas um ou outro galhardete, ou a camisola de algum jogador, o que é perfeitamente normal. As relações entre os árbitros e os clubes devem ser de cortesia, mas puramente institucionais. Qualquer tipo de aproximação no contexto atual do futebol, não é ainda possível.

R - Os árbitros estudam os jogos com cada vez maior cuidado, nomeadamente os jogadores que vão encontrar. No seu caso, como se processa esse estudo? 

DG - Tenho cuidado, mas um cuidado amador. Consigo disponibilizar alguma parte do meu tempo para procurar munir-me das ferramentas necessárias... Nós conhecemos os jogadores, mas não podemos criar um preconceito em relação a eles. Um jogador que tem um historial de simulações, pode mesmo ser derrubado dentro da área... É importante conhecê-los, mas não podemos fazer juízos de valor e essa linha é muito ténue e difícil de distinguir.Temos de saber quem são os jogadores mais refilões, os mais rápidos, quem tem mais técnica, etc... Mas é importante, tendo essa ferramenta, saber aplicá-la de forma correta.

"Motivo-me quando sou insultado"

R - Qual é o estádio mais complicado para os árbitros portugueses, ou pelo menos para si em particular?

DG - Motivo-me quando sou insultado. Por isso, os estádios que mais gosto são esses, onde ouço mais ruído. O pior para mim é quando não tenho gente nos estádios. Por exemplo, os campos do União de Leiria, do Belenenses, do Beira-Mar, da Naval... são estádios tenebrosos para quem está a arbitrar e a jogar. Quando não há ruído e festa e quando ouço o eco do meu apito é difícil concentrar-me.

R - Em que aspetos considera que pode melhorar como árbitro?

DG - Sou um árbitro mediano e isso não é falsa modéstia, pois seria vaidade. Tenho colegas com qualidades inatas melhores e por outro lado, sou muito crítico em relação às minhas atuações. Mesmo que sejam erros pouco visíveis, eu acho que posso fazer melhor. Nomeadamente ao nível da colocação no terreno e coordenação com os colegas. Diria que tenho de trabalhar muito a nível da colocação. Isto porque muitas vezes quero estar próximo dos lances e sou apanhado no meio das jogadas, por exemplo quando há jogadas de contra-ataque. E é difícil para nós acompanhar uma mudança de ritmo, não estorvando a jogada.

Infelizmente, já cometi muitos erros ao longo da minha carreira, alguns evitáveis, outros nem por isso. Mas mais do que a realização em termos classificativos, o meu objetivo é superar-me e tentar estar cada vez mais concentrado a cada jogo. Tento fazer uma boa gestão no relacionamento com os jogadores. Tento compreender os seus estados de espírito em cada momento, tentando aplicar a lei no meio disto tudo. Por vezes, não é fácil, mas é desafiante.

R - É defensor de equipas de arbitragem fixas ou entende que deve haver alguma rotação? 

DG - Neste momento, depois de termos experimentado rotação num período bastante vasto, sou a favor de equipas fixas. A cumplicidade de uma equipa que trabalha diariamente é a mesma que existe numa equipa de futebol que atua junta há vários anos... E se trocarmos de elementos, por muito bons que eles sejam individualmente, a equipa não funciona. Nas equipas fixas, quando olhamos um para o outro, já sabemos o que ele está a pensar.

R - É a favor da aplicação dos meios tecnológicos no futebol? Se sim, de quais?

DG - Sou a favor de tudo o que pode ajudar o futebol, mas que não retire a humanidade da modalidade. Falamos muito na televisão e na repetição de imagens. Mas as pessoas têm de pensar: se um jogo pára para se ver uma repetição três ou quatro vezes, há uma grande quebra de ritmo. E essas imagens podem suscitar opiniões diferentes de quem as analisa. Um sportinguista, um benfiquista ou um portista não analisam os lances da mesma forma, mesmo na televisão. E depois, o ónus da culpa seria para quem decidisse na televisão. A introdução da televisão não beneficia o futebol.

O que me parece inevitável é a questão do chip na linha de baliza. Essa é uma das piores decisões que temos de tomar. Só quem está literalmente na direção da linha de baliza é que consegue dizer a 100 por cento que a bola ultrapassou o poste e por isso entrou. É impossível o árbitro consiguir ver. Quanto ao assistente, está preocupado com o fora-de-jogo e por isso colocado três ou quatro metros atrás. Está a ver na diagonal e nunca vai ter a perceção real da situação. É um erro gravíssimo, com influência no resultado e que nós agradecíamos que nos tirassem das costas, pois não temos condições nenhumas para avaliar. 

R - Se fosse possível escolher o melhor e o pior jogo da sua carreira, quais seriam?

DG - Ao contrário do que as pessoas possam pensar, não escolho os jogos mais mediáticos. Com uma carreira de 20 anos de arbitragem, 14 dos quais na I Liga, tenho muito por onde escolher... O jogo mais marcante foi a minha estreia como árbitro, na altura assistente de António Marçal. Foi em Outubro de 1991, tinha 18 anos. Foi um encontro de iniciados, na Boa Hora. O jogo mais marcante pela negativa foi um que...quase arbitrei, há dois anos. Foi a final de um torneio particular. no CIF. Tive reações de tal forma adversas dos jogadores que aos 20 minutos entreguei o meu apito e vim-me embora. Foi a única vez que desisti de um jogo. Hoje em dia, talvez não fizesse isso, mas teria de ter expulso uma série de jogadores...

diversos:

Comentários [8]

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Este é mediano

O Olarápio Benquerença é o quê?

Se tu és mediano

não quero nem sequer imaginar os fracos!!!!

quem fala, o adepto ou o árbitro?

é um pouco perigosa esta afirmação,

" Ao menos o Apito Dourado foi bom nessa questão, porque foi preventivo, mesmo não tendo sido punitivo."

teria que haver forçosamente uma pebna, tendo o tribunal rejeitado as escutas? parece-me uma afirmação perigosa tendo sido proferida por um árbitro

Acho sinceramente que este

Acho sinceramente que este tipo de entrevistas são boas para o futebol, pois nós, adeptos raramente nos colocamos na pele dos árbitros, que nem sempre têm uma vida fácil.

Independentemente disto, não compreendo o 5º lugar deste senhor, pois não o acho sequer mediano, mas sim fraco. Mediano é o Proença, o resto são fracos, não só em questões técnicas, mas também e essencialmente em questões mentais como controlo do jogo e diálogo com os jogadores. Se a profissionalização aumentar a qualidade dos árbitros sou a favor, no entanto tenho as minhas dúvidas...

A profissionalização dos árbitros

só pode beneficiar a arbitragem. A meu ver, como pode um profissional ser pior que um amador? Se assim fosse, para quê jogadores profissionais? Para quê médicos profissionais? Para quê advogados profissionais? Etc, etc, etc.
Mas se calhar esta é uma visão simplistica da coisa. Por curiosidade, porque tens as tuas dúvidas?
Cumps

Profissionalizar

Com curso superior e mestrados, para encher os bolsos de mais uns parasitas.

Quando vais ao médico

pensas da mesma maneira? Médicos amadores seriam, concerteza, mais baratos. Porque não registas a patente e investes na ideia? Abres uma clínica e pode ser que tenhas sucesso. Mas para sócio, não contes comigo.

Comparar médicos com árbitros

É uma parvoice, desculpa que o diga, mas estás a ser meio parvo.