Crónica: não sou de nenhum clube, nasci para um...

Provavelmente porque não nasci numa família de vitorianos, não me orgulhando dela menos por isso; provavelmente porque não comecei a dar os primeiros passos e os meus pais me guardavam um cartão de sócio do Vitória com a fotografia da altura; provavelmente porque sempre me tentaram "levar" a vestir outras camisolas e a colocar outros cachecóis que não pretos e brancos, os quais jamais vesti ou coloquei; provavelmente por ter sempre "lutado" para hoje poder estar a juntar estas letras de alma e coração e poder dizer sou Vitoriano.E qual o sinónimo de Vitoriano?Se todos os sinónimos se podem encontrar num daqueles livros em que a ignorância do homem vem até, cuidadosamente colocada, por ordem alfabética, para que assim seja mais fácil ser encontrada, vulgo dicionário, há um que nunca virá, nem tão pouco será possível algum dia vir – Vitoriano.Porquê!?Muito, muito simples, porque "não é uma palavra", não é um estado de espírito de cada um, não é um ir ver os jogos todos ou nenhum, não é um tão pouco acompanhar o clube para todo o lado, não é o nascer em Guimarães e/ou ser do Vitória "desde pequenino". Isso qualquer adepto, de qualquer vulgar clube e cidade, pode fazer, não é nenhum feito épico. Na minha opinião, um Vitoriano não terá que ser de Guimarães, como eu e muitos outros, um Vitoriano pode ser de qualquer canto do mundo, tem é de o ser. Penso até que o Vitoria deverá alargar os horizontes associativos a outras cidades, não só do concelho, mas também a outros pontos do país e até do mundo. Sei da existência de comunidades em outros países em que o número de Vitorianos é elevado. Apesar da distância, não deixam de ser vitorianos, muito pelo contrário, são até um exemplo para outros vitorianos a nível de participação, ainda que virtual, no quotidiano do nosso clube. A esses, um abraço especial pois, soube o que é viver a "milhares de quilómetros" de Guimarães, neste caso 80 e tal, imagino o que não será viver a "milhões"!Ser Vitoriano é ser uma parte da definição, a parte de um todo que é o Vitória. E, nessa definição, nesse todo, só faz sentido quando existe esse todo. Apenas juntando todas as opiniões de todos os vitorianos numa, conseguiríamos dar a definição de Vitoriano.Sozinho não sou Vitoriano, não sou único, mas sei que juntos, eu, tu, ele, nós, vós e eles o somos. E não é pela ida ao aeroporto, pelo treino, pelo cordão, pela deslocação a Sevilha ou a Setúbal, não é pela marcha, muito menos pelos milhares de cadeiras vendidas (14151), ou pelo número de associados (24350). Apesar de estarmos na Liga de Honra, há quem tenha aos cento e tal mil associados e não seja único, há quem estejam no Livro de Recordes do Guiness pelo número de "sócios" e seja muito mais pequeno do que nós, muito menos único do que nós...Por muito que pareça história ou só para ficar bonito não é, nós herdamos isso do REI, do PRIMEIRO REI DE PORTUGAL. Quem, sendo vitoriano e vimaranense, nunca se deu conta parado em frente a uma porção de muralha degradada a ler as letras nela assentes - "Aqui Nasceu Portugal" - e a sentir um arrepio na espinha juntamente com um enorme orgulho a correr nas veias!? Esta é a pequena gigante diferença do nosso crer e da nossa mística, do nosso ímpar bairrismo em relação a outra qualquer cidade e a outros quaisquer adeptos.É a magia da nossa história que nos faz cantar "o Berço da Nação somos nós", "é com orgulho que visto branco", "preto e branco allez", "força Vitória, estou apaixonado"...Se um dia fizer um testamento, é certo que não literalmente, mas que palavras como as seguintes constarão: no dia do meu funeral não desejo estar engravatado, desejo albergar a camisola que tantos sorrisos me fez esboçar, que algumas lágrimas me fez verter, desejo também que as minhas cotas sejam pagas assim como o meu lugar anual mantido até que isso seja possível, espero sinceramente que o possível dure décadas. Se não fizer um testamento, quem me conhece sabe qual é a minha vontade.Isto é nascer para um clube, isto é não morrer para esse mesmo clube. E se muito mais gente não morrer para o seu clube, o futebol português deixará de ser o futebol da cauda da Europa e passará a ser a cabeça por onde passam os pensamentos de todos aqueles que nele mandam, no futebol.Ao invés do que possam pensar, não sou contra todo e qualquer adepto de um qualquer clube que não seja o meu, o Vitória. Sou contra todo e qualquer adepto que mata jornada a jornada o futebol. Sou contra todo e qualquer adepto para quem ser adepto de futebol é fácil, barato e dá protagonismo. Não, não falo daqueles que fazem o melhor que podem e sabem para apoiar incondicionalmente os seus clubes, falo dos do costume, dos das críticas de secretária, daqueles que se pronunciam e se revoltam com o mundo desde uma confortável cadeira ortopédica, com uma série de botões que a permitem reclinar, escolher a intensidade da vibração das massagens, etc; falo daqueles que criticam os que, num banco de pau, trabalham e tentam melhorar o NOSSO futebol, ao invés dos das cadeiras ortopédicas que nada fazem, quanto mais fazerem melhor.Um humilde conselho, por troca de ridículas votações para conseguirem os tachos do costume: tentem dar as vossas ideias e ajudem os que as tentam conseguir, por certo o futebol irá beneficiar muito mais.jmnc